O JOGO NA CONCEPÇÃO DE ALGUNS AUTORES
Para Piaget (1978), a origem das manifestações lúdicas acompanha
o desenvolvimento da inteligência vinculando-se aos estágios do desenvolvimento
cognitivo. Cada etapa do desenvolvimento está relacionada a um tipo de
atividade lúdica que se sucede da mesma maneira para todos os indivíduos. Outro
conceito essencial da teoria sobre o jogo é a relação deste com o processo de
adaptação, que implica dois processos complementares: a assimilação e a
acomodação.
A assimilação se caracteriza como o processo pelo qual a
criança, quando se depara com determinados problemas do mundo externo, utiliza,
para resolvê-los, estruturas mentais já existentes.
A acomodação é o processo pelo qual a criança, quando se depara
com o problema e não consegue resolver com as estruturas existentes,
modifica-as. Para Piaget, as crianças adaptam-se ao ambiente, através do
processo de equilibração.
Este conceito piagetiano se evidencia na atividade lúdica
infantil à medida que as crianças, ao jogarem, assimilam novas informações e
acomodam-nas às suas estruturas mentais.
Piaget (1978) identifica três grandes tipos de estruturas
mentais que surgem sucessivamente na evolução do brincar infantil: o exercício,
o símbolo e a regra. O jogo de exercício representa a forma inicial do jogo na
criança e caracteriza o período sensório-motor do desenvolvimento cognitivo.
Manifesta-se na faixa etária de zero a dois anos e acompanha o ser humano
durante toda a sua existência, da infância à idade adulta.
O jogo de exercício não supõe o pensamento nem qualquer
estrutura representativa especificamente lúdica.
De acordo com Piaget (1978), o jogo simbólico tem início com o
aparecimento da função simbólica, no final do segundo ano de vida, quando a
criança entra na etapa pré-operatória do desenvolvimento cognitivo. Um dos
marcos da função simbólica é a habilidade de estabelecer a diferença entre
alguma coisa usada como símbolo e o que ela representa, seu significado.
Sendo assim, concebendo a estrutura do símbolo como instrumento
de assimilação lúdica, Piaget observa que durante o desenvolvimento da criança,
surgem novos e diversos símbolos lúdicos que determinam à evolução do jogo
simbólico, meios para compensar, liquidar, nos casos onde o jogo até então era
indispensável.
Para Piaget (1978), o jogo de regras constitui-se os jogos do
ser socializado e se manifestam quando, por volta dos 4 anos, acontece um
declínio nos jogos simbólicos e a criança começa a se interessar pelas regras.
Não se identifica nos jogos de regras segundo Piaget (1978) o
processo de involução. Estes se desenvolvem e se mantém por toda a vida, como é
o caso dos esportes, cartas e outros.
Neste sentido, para o autor supracitado, o jogo de regras
apresenta um equilíbrio entre a assimilação ao eu e a vida social, marcando a
passagem do jogo infantil para o jogo adulto. As regras conferem legitimidade
ao jogo, inserindo, na competição, uma disciplina coletiva e uma moral de
honra.
Portanto, Piaget (1978) forneceu uma percepção sobre as crianças
que serve como base de muitas linhas educacionais atuais. De fato, suas
contribuições para as áreas da Psicologia e Pedagogia são imensuráveis.
O jogo na concepção de
Vygotsky
Vygostky (1999) estabelece uma relação estreita entre o jogo e a
aprendizagem, atribuindo-lhe uma grande importância. Para que possamos melhor
compreender essa importância é necessário que recordemos algumas idéias de sua
teoria do desenvolvimento cognitivo. A principal é que o desenvolvimento
cognitivo resulta da interação entre a criança e as pessoas com quem mantém
contato regular. Convém lembrar também que o principal conceito da teoria de
Vygotsky é o de zona de desenvolvimento proximal, que ele define como a
diferença entre o desenvolvimento atual da criança e o nível que atinge quando
resolve problemas com auxílio, o que leva à conseqüência de que as crianças
podem fazer mais do que conseguiriam fazer por si só.
Conforme Vygotsky (1999), não é todo jogo da criança que
possibilita a criação de uma zona de desenvolvimento proximal, do mesmo modo
que nem todo o ensino o consegue; porém, no jogo simbólico, normalmente, as
condições para que ela se estabeleça estão presentes, haja vista que nesse jogo
estão presentes uma situação imaginária e a sujeição a certas regras de
conduta. Sendo assim, o autor supramencionado, afirma que as regras são partes
integrantes do jogo simbólico, embora, não tenham o caráter de antecipação e
sistematização como nos jogos habitualmente regrados. Ao desenvolver um jogo
simbólico a criança ensaia comportamentos e papéis, projeta-se em atividades
dos adultos, ensaia atitudes, valores, hábitos e situações para os quais não
está preparada na vida real.
Vygotsky, (1999), também detecta no jogo outro elemento a que
atribui grande importância: o papel da imaginação que coloca em estreita
relação com a atividade criadora. Ele afirma que os processos de criação são
observáveis principalmente nos jogos da criança, porque no jogo ela representa
e produz muito mais do que aquilo que viu.
Na visão sócio-histórica de Vygotsky (1999), a brincadeira, o
jogo, é uma atividade específica da infância, em que a criança recria a
realidade usando sistemas simbólicos. Essa é uma atividade social, com contexto
cultural e social.
A noção de zona proximal de desenvolvimento interliga-se,
portanto, de maneira muito forte, à sensibilidade do professor em relação às
necessidades e capacidades da criança e à sua aptidão para utilizar as
contingências do meio a fim de dar-lhe a possibilidade de passar do que sabe fazer
para o que não sabe.Assim sendo, as brincadeiras que são oferecidas à criança
devem estar de acordo com a zona de desenvolvimento em que ela se encontra,
desta forma, pode-se perceber a importância do professor conhecer a teoria de
Vygotsky.
O jogo na concepção de Wallon
Wallon foi um estudioso que se dedicou ao psiquismo humano na
perspectiva genética, ou seja, ele defendeu a gênese da pessoa, na qual
justifica o seu interesse pela evolução psicológica da criança.
Segundo Ferreira (2003), a psicogenética walloniana oferece
subsídios para reflexão sobre as práticas pedagógicas. Ele considera que não é
possível selecionar um único aspecto do ser humano e perceber o desenvolvimento
nos vários campos funcionais nos quais se distribuem a atividade infantil (afetivo,
motor e cognitivo). Pois o estudo do desenvolvimento humano deve considerar o
sujeito como geneticamente social e estudar a criança contextualizada, nas
relações com o meio. Para Ferreira (2003), partindo desse pressuposto, podemos
dizer que a infância é um momento real e distinto de todos os outros, por isso
mesmo, deve ser considerado de acordo com as suas peculiaridades. É neste
período que expressamos nossos sentimentos, nossa criatividade da forma mais
espontânea possível quando as atividades lúdicas são predominantes. Sabemos que
é através das brincadeiras que as crianças estabelecem relação com o meio,
interagem com o outro, para construir a própria identidade e desenvolver sua
autonomia.
Segundo Winnicott (1975), o brincar facilita o crescimento e, em
conseqüência, promove o desenvolvimento. Uma criança que não brinca não se
constitui de maneira saudável, tem prejuízos no desenvolvimento motor e
sócio/afetivo. Possivelmente tornar-se-á apática diante de situações que
proporcionam o raciocínio lógico, a interação, a atenção.
"Brincar é parte integrante da vida social e é um processo
interpretativo com uma textura complexa, onde fazer realidade requer
negociações do significado, conduzidas pelo corpo e pela linguagem".
Ferreira (2003, p. 84)
Segundo Espíndola (2002), em sua teoria Wallon mostra que é
através da imitação que a criança vive o processo de desenvolvimento que é
seguido por fases distintas, no entanto, é a quantidade de atividades lúdicas
que proporcionarão o progresso, e diante do resultado, temos a impressão que a
criança internalizou por completo o aprendizado, mas, ela só comprova seu
progresso através dos detalhes.
Wallon (1981) compreende que as etapas do desenvolvimento
evidenciam atividades em que as crianças buscam tirar proveito de tudo. Os
jogos comprovam as múltiplas experiências vividas pelas crianças, como:
memorização, enumeração, socialização, articulação, sensoriais, entre outras.
Debruçando-se nas idéias de Wallon, percebe-se que os jogos para
a criança são progressão funcional, já para o adulto é regressão, "porque
o que existe é a desintegração global da sua atividade face ao real"
Wallon (1981, p. 79). Ou seja, para o adulto acontece o contrário, pois ao
longo da vida o homem se aborrece por ser criança e quer o mais rápido possível
se desligar completamente das atividades lúdicas, aproximando-se de atividades
como o trabalho. Posteriormente deseja ser criança outra vez, então relaxa
quando está ao lado de uma criança, se permitindo realizar atividades sem
compromisso.
Percebe-se que sua concepção diz que, o lúdico e infância não
podem ser dissociados, toda atividade da criança deve ser espontânea, livre de
qualquer repressão, antes de tornar-se subordinada a projetos de ações mais
extensas e transformadas. Portanto, o jogo é uma ação voluntária, caso
contrário, não é jogo, mas sim trabalho ou ensino.
O papel do adulto e educador se faz necessário numa vivência em
todas as fases da infância, pois é importante ter atrelado ao seu
auto-conhecimento e autoconsciência, o conhecimento teórico. Desta forma, ele
estará preparado para intervir no jogo infantil, de maneira adequada,
destacando o progresso e proporcionando mais crescimento. O adulto deve ser um
facilitador do jogo e não um jogador. Brincar com criança não é perder tempo, é
ganhá-lo; se é triste ver meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los
sentados enfileirados, em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para
a formação do homem.